| 09 Setembro 2012
http://www.midiasemmascara.org/artigos/governo-do-pt/13392-senhores-senadores.html
Publicado no jornal Zero Hora.
O
projeto do novo Código Penal colide com valores, conceitos, s
enso de
proporção e prioridades bastante consolidadas na sociedade brasileira.
Os
senadores da República têm em mãos um projeto de Código Penal para o Brasil. Os
leitores que já se detiveram sobre o texto terão percebido: o melhor destino
dessa peça é o recipiente de lixo orgânico. Do reciclável periga retornar.
Pergunto: como acolher por bom um projeto que estabelece pena de um a quatro
anos para quem se omitir (art. 388) de prestar socorro a um "animal"
- vale dizer, qualquer ser vivo, pluricelular, heterotrófico, etc, etc, etc. -
e pena de um mês com máximo de seis para quem se omitir de socorrer uma criança
extraviada (artigo 132)? Ou ainda, pode tramitar como coisa de serventia uma
proposta de Código Penal que quer pôr na cadeia por até quatro anos quem
modificar um ninho de ave (art. 388), mas transforma em elástico vencido e desbeiçado
as restrições constitucionais e penais referentes ao aborto, com a inclusão da
certificada incapacidade materna para cuidar do bebê (art. 128)? Tratando-se de
seres humanos, não tem ninho, não tem nada: vai no útero e mata o feto. Não é à
toa que o professor Miguel Reale Júnior qualifica o projeto inteiro como uma
obscenidade.
Alguém
dirá - "Bem, isso tem conserto" - mas o projeto não pode ser
melhorado pelos motivos que vêm sendo denunciados por eminentes juristas e criminalistas
em todo o país, alarmados com as falhas técnicas, vocabulário errado,
definições imprecisas e desproporcionalidades que berram dentro do projeto.
Entenda-se. Precisávamos de um novo Código Penal. O velho, de tão remendado
ficou irrecuperável. Era um caso perdido. Pois bem, assim como o velho não
tinha solução, tampouco o anteprojeto proposto pelos notáveis de José Sarney
tem compostura possível. A intenção de votar aquele calhamaço de 545 artigos
até o dia 4 de outubro é uma total irresponsabilidade! E a ideia de acrescer 30
dias a esse prazo, também.
Não
se diga que me excedo. Não há qualquer exagero ou excesso em afirmar que esse
projeto colide com valores, conceitos, senso de proporção e prioridades
bastante consolidadas na sociedade brasileira. Prioridades, senso de proporção,
conceitos e valores com os quais estamos habituados a lidar e fazem parte do
nosso senso de justiça. No entanto, tudo isso vem sofrendo o ataque sistemático
de grupos sociais, tão minoritários quanto influentes e organizados. O projeto
do novo Código Penal reflete as posições desses segmentos, cada vez mais
interessados em agir sobre as instituições nacionais para moldá-las segundo
seus gostos e desgostos. As evidências de que há uma estratégia em curso enchem
páginas de jornais e raros são os formadores de opinião dela divergentes. Como
os eleitores devem ter percebido, estou falando do "politicamente
correto", ao qual o projeto faz ensandecidas concessões, e de uma visão de
Estado que a opinião pública rejeita. É por causa de ambas que o projeto
legaliza o consumo de drogas e o pequeno tráfico. É por igual motivo que o
projeto envolve com o manto da "exclusão de crime" o ato terrorista
praticado individual ou coletivamente por pessoas movidas com intuito social ou
reivindicatório, "desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e
adequados à finalidade" (art.239).
O
projeto fala a voz desses pequenos grupos de enorme influência, malgrado sua
dissintonia com o Brasil real, ainda não contaminado pelo relativismo e pela degradação
do humano em todas as suas dimensões.
http://www.midiasemmascara.org/artigos/governo-do-pt/13392-senhores-senadores.html
Publicado no jornal Zero Hora.
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