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Penha, zona leste de São Paulo, lá pelo ano 1956 ou 58, nossa “turminha” era composta de oito ou dez meninos, companheiros constantes nas “artes” e brincadeiras.
Em alguns momentos, as meninas também participavam, elevando o número a mais de vinte crianças.
As brincadeiras eram as mais diversas: balança-caixão, bate-bola, bolinhas de gude, queimada, chutar-lata, esconde-esconde, mão-na-mula, etc..
Além dessas, brincávamos com os inventos da hora, pois tudo era motivo e qualquer coisa servia para brincar.
Foram muitas as nossas artes, algumas inusitadas, e, entre estas, o dia em que sepultamos o gato.
Todos da nossa turma já tivéramos a oportunidade de ver algum cortejo fúnebre, solene, quando muitas pessoas levavam o caixão ao cemitério. Parecia uma grande procissão, todos com ar triste, acompanhando os familiares chorosos...
Talvez nenhum de nós soubesse exatamente o porquê daquilo, pois, felizmente, não houvera morte em nenhuma de nossas famílias, mas sabíamos que era um momento importante, marcante, onde as crianças não participavam, a não ser andando próximas aos adultos.
Um dia resolvemos fazer algo parecido, e quero contar como foi:
O Flávio tinha um gato, daqueles grandões, preto e branco, já velho e sem dentes, e, como ocorre com os seres vivos, um dia esse bicho morreu. Como esse gato era do nosso amigo, então era amigo de todos nós, assim, decidimos que ele merecia um sepultamento à altura.
Lembramos da necessidade de um caixão, e fomos providenciar.
Caixa de sapato não dava, era pequena, caixa de sabão era grande demais. No armazém do Sr. Pompeu, italiano amigo, conseguimos uma caixa de papelão no tamanho certo.
Nela colocamos o gato, enfeitamos com algumas flores silvestres, nos organizamos e saímos em marcha, rumo a um lote vazio, onde brincávamos sempre, para sepultar o bicho. Como a distância até o terreno era muito pequena, decidimos dar a volta no quarteirão, para o cortejo durar mais.
Caras tristes, mas sorrindo de felicidade, Íamos batendo paus, latas e tudo o mais, a fim de chamar a atenção e tornar aquilo mais glorioso. Foi um sucesso!
Chegados ao lugar escolhido, cavamos um buraco, colocamos a caixa, cobrimos de terra e flores, e fincamos um pau como marcação.
Perfeito!
Depois, fomos todos à casa do Flávio tomar uma limonada para comemorar o enterro, com o senso do dever cumprido.
Poucos gatos tiveram um funeral tão pomposo, mesmo que, alguns dias depois, poucos se lembrassem do ocorrido.
Hoje, muitos anos depois, eu me lembrei, e vi que, apesar do capricho, ser coveiro não era nosso dom. Cada um de nós seguiu uma profissão diferente dessa.
Velho Pescador.
São histórias como essa que nos fazem viajar no tempo; valeu!
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