Garimpando no Luso-poemas, encontrei mais um artigo que, autorizado, trago para leitura.
O cognome do Autor é curioso: Úmero
Card'Osso e a reflexão tem o título:
Carta para questionar o valor da imagem
não deixes
a televisão esfriar tua alma
não deixes
que alguém
ligue a televisão
num momento
de nervosismo
e ainda que
fosse com calma
Resolve
antes os teus rancores
sem
distração, sem televisão, sem sabores
que são do
tempo distorção
e da alma
horrores!
Façam-me os
favores
de se
apresentar diante
do
espetáculo estonteante da Vida como senhores
não como
escravos
do
individualismo, do imediatismo
de uma
época onde não há bravos
Não deixes
a televisão
ludibriar
teus sentimentos
substituir
teus relacionamentos
esfriar tua
alma!
Não ligues
a televisão num momento de imediatismo
de
desassossego ou de calma.
Diante tão
somente dos espetáculos da Vida
– distante
dos tentáculos da mídia –
bate
palma...
Bate palma,
bate!
Bate palma,
aplaude a Natureza!
Não
aplaudas as imagens mortas
os
labirintos de tristeza, de milhares de portas
da
televisão, da novela das sete,
e ainda que
fosse o labirinto
da
internet...
Vós que
sentais neste recinto!
Preferi
sempre uma conversa tet a tet
do que
conversas absortas
que tu
mesmo exortas
a outros
que nem vês
num
neolabirinto pós-burguês...
Ah, quem
são vocês? ... Quem são vocês?
Preferi
sempre um diálogo com flores mortas
a um
gozólogo de insensatez
ou a um
monólogo com quem tendes
relacionamentos
por paredes
ou
pensamentos em que não credes...
Ah, por que
foram se meter todos vós
nestas
imagens vazias, alienadas,
nestas
bobagens vadias, alternadas
em que
estais, em verdade,
todos sós
de maneira
que não estiveram os vossos avós?
Eu questiono
o uso da televisão
o abuso do
coração
o desuso da
explosão
da vida dos
que são
mais
verdadeiros consigo
porque não
afundam a própria alma
nos
atoleiros da palma
da mão, ou
do próprio umbigo
ao teclado
ao som de
uma música de computador
cuja propriedade
é ser sem propriedade... sem cantor!
Preferi
sempre um diálogo com flores mortas
com santos
imaginários
ou com
fezes no deserto
que com
certeza, às vezes,
indicam
alguém por perto :
um amigo,
alguém que
precise de auxílio
um amigo
que não é um umbigo
ou uma
página mal feita no exílio
que é estar
num provedor
sob um
congelamento infotécnico do humor...
Um amigo
que no deserto
ou por trás
de flores amassadas
acabadas,
queimadas ou roubadas
será
verdadeiro convosco, contigo,
comigo, e
não se apresentará como um tosco
scrap,
e-mail, add ou “quem quebrar esta corrente estará atraindo para si um grande
azar”
e talvez um
dia este poema, este lero-lero
termine com
um bolero num bar
embora eu
preferisse
um tango
virulento, real, truculento,
um tanto
sensual e sem chatice...
Ah, os
onanistas na frente de um computador
como se
condenam!
os que se
entregam ao amor
infomanual
ou videotécnico
das tardes
de solidão ou abandono...
nas noites
sem sono da televisão!
Os que
viciam-se no pragmático
estuporamento
de um tesão hiperartificial
seja por
uma televisão sub-sensual,
seja por
uma rede de computação
pornogramada
para matar em vocês
a inocência
de fazer tudo sempre
como se
fosse paciência
como se
fosse a primeira vez!
Eu poderia
falar por horas e horas,
condenar,
mostrar para todas as senhoras
com
palavras lindas, ou feias
o que
fizeram delas
nessas
redes, paredes, labirintos
ou teias...
Condenar
todo abuso
todo mal
uso de computadores
da parte
dos moleques
da parte
dos senhores.
Mas por
favor, não me aparte
desta briga
não me
empurre com os seus vídeos
ou cedês,
nem vocês, com a barriga.
Permiti
vós, a mim, que sou tosco
dividir
convosco parte
de minha
justificativa infame
que me
levará para a luta
ou disputa
corporal num tatame
de forças
que vão além da moral
porque
minhas intenções
vão além de
condenar o que fazem
porque não
existe o mal
e sim, por
um outro lado,
estou
plenamente amparado
na
justificativa sempre viva
ou intenção
de que
essas pessoas mortas – sempre tortas –
endireitem
suas vidas
estreitem
os seus laços
registrem
com amor todas as despedidas
arrebentem
os cabaços!
Pois de
minha parte, com muita arte,
não condeno
o que fazem
mas o que
deixam de fazer
por se
prender
a qualquer
bobagem
da
tecnologia do lazer...
Ah, flores
mortas, queimadas ou desenhadas!
Ah, fezes
no deserto que indicam alguém por perto!
Ah, amigos!
Que tu tenhas
amigos
sem
umbigos, sem fios,
sem cabos
elétricos, sem senhas!
Que tu
tenhas
amigos!
Ah, Vida!
Ah, conversas!
Ah,
diálogos, ah, perversas!
Como dão-me
prazer!
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